Data: 12/05/2005
  Tema: Transposição do rio São Francisco
  Participante: Deputado Marcondes Gadelha (PTB-PB)


Confira abaixo as perguntas que foram respondidas pelo relator da Comissão Especial do Semi-Árido, deputado Marcondes Gadelha (PTB-PB). O bate-papo está dividido em cinco blocos: opinião pública, custos e prazos, meio ambiente, benefícios e histórico.

Opinião pública

(09:36) Alexandre: Como engenheiro eletricista não posso concordar com a total falta de fundamentação técnica e econômica acerca da energia a ser gasta e disponibilizada para o projeto, num contexto onde o setor elétrico caminha para sua consolidação, após anos de anarquia energética. A insistência em tocar tal projeto dessa forma autoritária, antidemocrática e tecnicamente falha é uma grande irresponsabilidade com a gestão pública. Depois, quando houver um acionamento judicial e criminal dos responsáveis pela obra e pelos seus efeitos, não vão dizer que é perseguição política, pois são cúmplices. Por que não fazem um plebiscito sobre o tema? Porque insistem em chantagear emocionalmente os opositores ao projeto, demagogicamente afirmando que é para matar a sede de 12 milhões de nordestinos quando a intenção é outra?

(09:57) Dep Gadelha: Alexandre, na qualidade de engenheiro eletricista, você tinha a obrigação de apresentar objeções técnicas, números referentes ao uso de energia, impacto sobre a matriz energética e coisas dessa natureza. Em vez de assumir a sua responsabilidade profissional, você prefere repetir chavões e agredir os autores do projeto. Mas vou lhe adiantar que a gestora do projeto será a Chesf, que mais do que ninguém sabe do potencial instalado e do consumo de energia na Região Nordeste. A redução na oferta energética será mínima, algo em torno de 110 megawatts, facilmente compensáveis através do linhão de Tucuruí (já existente e já utilizado em outras ocasiões) e de outras fontes já disponíveis ou a serem implantadas, como energia da biomassa, energia eólica, termelétricas, etc. Informo ainda que o bombeamento se dará de madrugada, quando os pontos de carga principais (Salvador, Fortaleza, Recife, etc) estarão silenciosos. Além disso, haverá compensações com pequenas geradoras do outro lado da Chapada do Araripe. De qualquer forma, a própria Chesf já se pronunciou sobre esta matéria, que é página virada e não tem sido mais objeto de discussão.

(10:09) Lorenzo-OEco: Se não há impacto significativo, a que o senhor atribui a enorme resistência da sociedade civil de quase todos os estados afetados e dos governos da BA e MG especialmente?

(10:39) Dep Gadelha: Lorenzo-OEco, a resistência não é necessariamente da sociedade. Temos pesquisas de opinião feita pela Vox Populi que mostra que 70% da população de Minas aprovam a transposição e que, na Bahia, a opinião pública está dividida quase meio a meio. A resistência é movida, na verdade, por grupos ambientalistas e por lideranças políticas. Acredito que a causa básica é o desconhecimento do projeto, para não falar em egoísmo ou má fé. As pessoas que tomam conhecimento do projeto compreendem imediatamente a sua lógica e se posicionam a favor. É por isso que as audiências públicas foram impedidas naqueles estados e mais em Sergipe e Alagoas, porque as lideranças contrárias querem vedar ao grande público a informação sobre as vantagens e a racionalidade da obra. Para isso, não se incomodam de usar meios ilegais e muitas vezes a própria violência. O projeto, insisto, é o mais seguro do mundo em seu gênero, do ponto de vista ambiental, e tem uma relação custo/benefício insuperável, além de uma utilidade social como pouquíssimos projetos apresentados no Brasil.

(10:17) Willy: Deputado, o senhor concorda que se faça um plebiscito, para que o povo opine, conforme propõe o deputado federal Luiz Carreira?

(10:19) Edinho Magalhães: Mas que povo, Willy? O dep. Luiz Carreira é da Bahia, que historicamente foi e é contra a transposição das águas do Velho Chico. Acha que vai sair perdendo com isso. É bom saber que povo participaria do plebiscito: quer os nordestinos que em sua maioria esmagadora quer o resto do Brasil que - em tese - nem perde, nem ganha.

(11:16) Dep Gadelha: Willy e Edinho, a proposta de um plebiscito agora parece apenas uma medida protelatória, uma forma de empurrar com a barriga o problema e adiar uma vez mais a decisão que já é aguardada há 150 anos. Essa proposta deveria ter sido apresentada há pelo menos cinco anos para que se pudesse dimensionar o universo dos votantes e abrir espaço à comunicação social para conhecimento das posições contra e a favor e, afinal, conferir alguma legitimidade ao processo. Agora, depois de concluídos todos os estudos, concedida a licença ambiental e publicado o edital de concorrência, parece uma proposta extemporânea com objetivo de confundir a opinião pública. É importante verificar que a transposição cumpriu todo o ritual para se caracterizar como um ato jurídico perfeito, contra o qual novas leis não podem ter força cogente. A transposição foi votada no Congresso junto com o orçamento. Ela integra como rubrica e como dotação uma lei que foi votada inicialmente na Comissão Mista de Orçamento, depois no Plenário e posteriormente sancionada pelo presidente da República. Nenhuma objeção de monta foi apresentada na ocasião e nenhum questionamento foi oferecido quanto a sua constitucionalidade e juridicidade. Vivemos numa democracia representativa e a posição do Congresso Nacional é a posição da Nação por ele representada.

(10:17) marcos ferro: Os que lucram com a indústria da seca são os principais opositores do projeto. Temos que dar um basta nesta situação.

(11:07) Dep_Gadelha: Marcos, concordo plenamente com você. Desde os primórdios da colonização do sertão nordestino que pessoas lucram com o desespero decorrente da falta de água. Assegurar ao nordestino que não lhe faltará água é como conceder a ele uma carta de alforria em relação àqueles que se aproveitam dessa condição e mantêm um status quo que passa necessariamente pela submissão do sertanejo. Obviamente, a transposição não é uma panacéia e outras ações complementares deverão ser executadas, mas o que posso afirmar com convicção é que, sem água, o Nordeste está fadado a permanecer dependente das ações bissextas do governo central. E, com água, quem está fadado a desaparecer é o aproveitador que lucra com a carência alheia.

Custos e prazos

(09:39) Gustavo: Quanto custaria transpor o rio?

(09:59) Dep_Gadelha: Gustavo, o custo total da obra é de R$ 4,5 bilhões. Isto é equivalente aos gastos governamentais com medidas paliativas em apenas dois anos de seca no Nordeste em ações como contratação de carros-pipa, frentes de emergência, cestas básicas e outros pagamento de auxílios financeiros, além dos enormes custos decorrentes da dizimação dos rebanhos e da perda das lavouras, sem falar nos custos sociais que advêm dos problemas de saúde ligados à ausência de água de boa qualidade. Esses são também bancados pelo governo. Assim, fica claro que o custo de fazer a obra é menor do que o custo de não fazer.

(09:57) Estudante Eng 2: Bom dia, supondo que o projeto saia do papel, quanto custará a água a ser transposta e quem irá arcar com esse custo?

(10:01) Dep Gadelha: Estudante Eng 2, o custo da água será de R$ 0,11 por metro cúbico, um preço absolutamente razoável. Esse valor será intermediado pelas empresas estaduais de abastecimento e pago na ponta pelo usuário final, exceção feita aos projetos de reforma agrária e agricultura familiar distribuídos ao longo dos canais e que farão jus a subsídios cruzados.

(10:09) Simone: A conta de água dos moradores da região vai aumentar ou diminuir depois da transposição?

(10:28) Dep Gadelha: Simone, a conta de água não será alterada depois da transposição. Haverá um sistema gerencial moderno encabeçado pela Chesf e envolvendo outras repartições públicas que vão assegurar a chegada de água bruta com preços abaixo do mercado, fazendo com que a água tratada não sofra alteração de preço. Participam também do sistema a Agência Nacional de Águas (ANA), o próprio Ministério da Integração e os governos estaduais pelas suas empresas gestoras de água, operando todos articuladamente para que o interesse público seja preservado e nenhum dano venha a ocorrer para o usuário.

(10:09) Gustavo: De que fontes o governo retiraria os recursos necessários à transposição?

(10:34) Dep_Gadelha: Gustavo, o plano plurianual contempla a realização desta obra. Para o ano de 2005, por exemplo, o Orçamento Geral da União previu a alocação de R$ 600 milhões para a consecução da primeira etapa. Outras fontes de recurso serão a Chesf, hoje maior beneficiária das águas do rio, o BNDES e eventualmente agências internacionais de desenvolvimento. Cabe ressaltar que, em comparação com projetos semelhantes, ora em curso em outras nações, o custo do projeto de transposição do São Francisco chega a ser ínfimo. A transposição do rio Amarelo, na China, por exemplo, consumirá US$ 62 bilhões, e deverá transpor cerca de 1,6 mil metros cúbicos por segundo para regiões que, a exemplo do Nordeste brasileiro, padecem da falta de água.

(10:21) Willy: O projeto prevê usar R$ 4,5 bilhões dos recursos de investimento do Tesouro Nacional em apenas 18 meses. Se, no ano passado, tivemos apenas R$ 11 bilhões para investir em todo o País, não é um montante muito grande para se investir em um único projeto?

(10:23) Edinho Magalhães: Só teve R$ 11 bilhões por que o governo contingenciou. A capacidade de investimento do Brasil é enorme!!!!

(11:13) Dep_Gadelha: Willy e Edinho, neste caso, há duas considerações a se fazer. Em primeiro lugar, quero lembrar que parte dos recursos advirá de fontes externas ao orçamento da União, como a Chesf e o BNDES. Portanto, não haverá sobrecarga para o Tesouro. Por outro lado, creio que já é hora de a população brasileira passar a exigir uma maior participação de ações de infra-estrutura na composição do orçamento nacional. Inúmeras pesquisas mostram que a falta de infra-estrutura adequada, em todas as áreas e campos econômicos, tende a ser o principal gargalo no processo de desenvolvimento nacional nas próximas décadas. No caso do Nordeste, nós não podemos permitir que alegações dessa natureza impeçam o nosso crescimento. Creio que a lógica deve ser a de aumentar a fatia de recursos destinados a ações de infra-estrutura, em vez do recorrente e pernicioso contingenciamento para pagamento de juros e encargos da dívida, por exemplo.

(10:32) Alexandro Pereira: Nas últimas duas secas, o governo gastou em torno de R$ 4 em medidas paliativas durante pouco tempo. O investimento de R$ 4,5 será para um horizonte de 25 anos. É um único projeto. Agora, em relação a custo/benefício é viável?

(10:34) Willy: Não, a previsão do governo é R$ 4,5 bilhões em 18 meses e US$ 6,5 bilhões para um horizonte de 20 anos!

(11:32) Dep Gadelha: Alexandro e Willy, a previsão do governo é R$ 4,5 bilhões para o projeto de transposição de águas apenas. Mas o governo acolheu proposta do comitê de bacias do rio São Francisco de gastar mais R$ 5,2 bilhões em ações de revitalização. Esses recursos estão assim distribuídos: saneamento básico (84,1%), abastecimento de água para a população rural dispersa e agrícola (8,9%), ação institucional, regulação da água e educação ambiental (1,8%), proteção e recuperação ambiental e reflorestamento (2,7%), controle de erosão, melhoria da navegabilidade e assistência técnica (2,5%). Informo que o governo já está aplicando para saneamento básico R$ 612 milhões em 86 municípios e R$ 100 milhões em ações de proteção das margens do rio.

(10:37) Gustavo: Não existe uma outra solução técnica mais econômica, como os açudes, poços e cisternas para resolver o problema da seca no Nordeste?

(11:40) Dep_Gadelha: Gustavo, as soluções citadas são importantes e vêm sendo implementadas há séculos. No entanto, de forma isolada, elas não foram capazes de resolver o problema maior do nordestino. Não se trata apenas de acumular água, mas de garantir que esta água estará disponível a qualquer momento. Quando chove, os açudes e as cisternas captam com certa proficiência estas águas, mas devido a fatores climáticos e humanos estes mecanismos não conseguem reter a água em épocas de seca. Assim, o nordestino não conta com segurança hídrica. Quando um novo ano se inicia, um agricultor do sertão do Nordeste precisa fazer uma aposta para decidir se planta ou não. Infelizmente, muitas vezes, essa aposta se transforma em perda e após repetidas desilusões o proprietário rural passa a ser refratário à idéia de plantar. Inicia-se, então, um ciclo no qual o nordestino não produz por medo de perder e perde por medo de produzir. A existência de rios perenes próximos às áreas agricultáveis é a certeza de que haverá água para irrigar as plantações do sertanejo.

(10:40) Lorenzo-OEco: Deputado, qual é a previsão para o início das obras?

(11:50) Dep_Gadelha: Lorenzo, o edital de licitação foi publicado anteontem (10/5). Trabalhando com a hipótese de que haja recursos ao resultado do processo e considerando alguns trâmites burocráticos inevitáveis, creio que um prazo factível para o início das obras seria o do mês de agosto de 2005.

(11:07) Rose: Quando que essa transposição vai de fato sair do papel e como o governo vai administrá-la para que ricos e poderosos não tomem conta das margens da transposição?

(12:03) Dep Gadelha: Rose, acreditamos que o início das obras aconteça dentro de 90 dias e que se levem dois anos para a sua conclusão. Assim sendo, as águas estarão correndo nos canais a partir de agosto de 2007. Com relação aos ricos e poderosos, informo que o governo já iniciou o levantamento fundiário ao longo dos canais para efeito de desapropriação. Ou seja, o único segmento da população que vai ter acesso direto à água através de 400 pontos de captação serão os assentados de reforma agrária e aqueles dedicados à agricultura familiar. Ricos e poderosos não estão incluídos nesta chave.

Meio ambiente

(09:59) Damon: Antes de se pensar a transposição, não teria que se levar em conta uma recuperação do rio São Francisco no seu leito atual, pois o mesmo já vem sofrendo grande degradação ambiental, podendo levar este projeto ao fracasso.

(10:07) Dep_Gadelha: Damon, não há nada que vede a realização simultânea das duas ações, o que inclusive está previsto no projeto desenvolvido pelo Ministério da Integração Nacional. Os estudos técnicos realizados, tanto pelo governo federal quanto pelos dois maiores grupos mundiais da área de impacto ambiental, apontaram para a não-existência de qualquer impacto negativo sobre a bacia do rio São Francisco e a as bacias receptoras com a implementação da interligação. Isso prova que as obras do projeto de transposição podem correr em paralelo às ações de revitalização do rio. Gostaria de lembrar apenas que, desde o advento da Constituição de 1988, os estados e municípios ribeirinhos já recebem uma verba específica para essas ações de revitalização, decorrentes do pagamento de royalties pela Chesf, totalizando nesses 17 anos algo próximo a R$ 1,5 bilhão. Tal valor, se tivesse sido corretamente empregado, teria sido suficiente para abranger todas as ações de revitalização ora previstas. Cabe lembrar, por fim, que os recursos para revitalização continuam sendo liberados e somente para o ano de 2005 o orçamento da União prevê a disponibilização de R$ 56 milhões para tal fim.

(10:15) Damon: Bem, se vão ser empregados R$ 56 milhões em 2005 e como o senhor disse que até o momento as verbas destinadas para este fim não foram empregadas corretamente, não vejo uma situação diferente para o futuro. Então, como fiscalizar a aplicação correta deste orçamento?

(10:18) Regina: Reforço a pergunta do Damon. Se já existe o dinheiro para a REVITALIZAÇÃO do rio, como FISCALIZAR a aplicação deste dinheiro??? A comunidade nem sabe que ele existe...

(10:59) Dep_Gadelha: Damon, os recursos anteriormente destinados a este fim advinham dos royalties pagos pela Chesf, diretamente aos entes federados envolvidos. Os R$ 56 milhões a que me refiro neste momento são oriundos do orçamento da União e como tal passam por todas as etapas de controle interno e externo dos recursos públicos no País, o que me faz crer que serão necessariamente melhor empregados. Não obstante os mecanismos oficiais de controle, considero extremamente importante que membros da sociedade, como você, tomem conhecimento desta realidade e nos ajudem a cobrar a aplicação correta destes recursos. À medida em que a sociedade passa a conhecer melhor os seus direitos, o poder público passa a ser mais eficiente. Quero lembrar apenas que, com este R$ 1,5 bilhão, repassados pela Chesf ao longo dos últimos 17 anos, a revitalização do rio São Francisco seria agora apenas uma questão de manutenção.

(11:13) Damon: Volto a insistir no meu questionamento. "Bem, se vão ser empregados R$ 56 milhões em 2005 e o como o senhor disse que até o momento as verbas destinadas para este fim não foram empregadas corretamente, não vejo uma situação diferente para o futuro. Então, como fiscalizar a aplicação correta deste orçamento?"

(12:13) dep Gadelha: Damon, os recursos oriundos do orçamento são fiscalizados pelos órgãos de controle interno do ministério responsável, pelo Tribunal de Contas da União e pelo próprio Congresso Nacional. Infelizmente, a Constituição de 1988 não previu mecanismo tão consistente de controle dos recursos repassados pela Chesf a título de royalties. Assim, é muito mais transparente a aplicação dos recursos advindos do orçamento do que os seus sucedâneos da Chesf. Porém, creio que este debate sobre a transposição trouxe consigo um importante efeito colateral, que é o de informar as populações dos estados e municípios ribeirinhos sobre a existência deste dinheiro tão útil à justa causa de defesa da saúde do rio São Francisco. Aproveitemos essa oportunidade para aprimorar os mecanismos de aplicação e controle dos recursos de royalties. Da minha parte, pretendo apresentar projeto que obriga a aplicação desses recursos em ações de revitalização e institui controle semelhante ao das verbas do orçamento, mas deixo aberto o canal para receber sugestões que possam enriquecer e melhorar o meu projeto.

(10:11) Regina Fala com TODOS: Na comunidade de Piaçabuçu e Penedo (AL), argumentam que o trecho entre Piaçabuçu e a foz do rio está bastante assoreado, as águas do mar já entram no rio e os peixes estão escassos, pois os peixes do mar já entram no rio até Piaçabuçu, pelo menos, afastando os peixes do rio... Esta transposição não vai piorar o problema? Afinal, eles ainda vivem da pesca...

(10:45) Dep_Gadelha: De maneira alguma, Regina. Como eu já disse, este projeto visa a retirar apenas 1% da vazão firme do rio. Nos anos de seca mais aguda nas nascentes do rio, a vazão firme na foz do São Francisco (Piaçabuçu) é de 1,8 mil metros cúbicos por segundo. E a sua vazão média é ainda superior, totalizando 2,7 mil metros cúbicos por segundo. Portanto, o bom senso indicaria que a retirada dos 26 metros cúbicos por segundo a que se propõe o governo federal não seria suficiente para arriscar a incolumidade do rio. Contudo, optou-se por realizar estudos técnicos nesse sentido. O resultado desses estudos, realizados por órgãos públicos e empresas privadas contratadas, apontou para a inexistência de qualquer impacto negativo sobre o rio e seus afluentes, o que comprova a segurança da atual versão do projeto. Além disso, entre as prioridades estabelecidas pelo plano de bacias no projeto, está contemplado o controle de erosão, com a melhoria da navegabilidade e da assistência técnica aos pescadores da região, que receberá R$ 125 milhões para tal fim, solucionando o problema da erosão e implementando políticas complementares de fomento à pesca na foz.

(10:12) cicareli: O estudo do impacto ambiental que permitiu a licença do Ibama está dentro dos padrões?

(10:53) Dep_Gadelha: Cicareli, inicialmente, gostaria de esclarecer que os estudos não são realizados diretamente pelo Ibama, mas sim por empresas especializadas no assunto, contratadas pelo órgão. Após a entrega dos relatórios por parte dessas empresas, os técnicos do Ibama se reúnem para atestar ou refutar as impressões apresentadas. Tal metodologia reforça a segurança que a sociedade precisa ter acerca de projetos dessa natureza. Assim, os técnicos mais renomados na área elaboram seus pareceres e os representantes do poder público os revisam. Uma vez que todas essas etapas foram cumpridas e nenhuma objeção de natureza técnica foi levantada, a população brasileira pode se tranqüilizar em relação à incolumidade do rio e das bacias receptoras. Sem sombra de dúvida, posso afirmar que este se trata de um dos mais seguros projetos do mundo no que tange a transposição de águas.

(10:33) Josias: A natureza é que regula o volume da água no rio São Francisco. Ocorrendo um fator meteorológico e minguando as águas do rio, não seria mais uma obra obsoleta?

(11:33) Dep_Gadelha: Josias, os cálculos do projeto observam uma série histórica de mais de cem anos. Quando falamos na vazão firme de cerca de 1.825 metros cúbicos por segundo, estamos nos referindo aos anos de seca mais aguda dentro da série estudada. Portanto, não há hipótese técnica de que o rio possa, em algum momento da sua história, apresentar vazão inferior a essa. Repito que, na maior parte do tempo, a vazão do rio é de cerca de 2,7 mil metros cúbicos por segundo e em momentos mais propícios este número chega a duplicar. Tanto os técnicos das empresas contratadas quanto os dos órgãos públicos foram unânimes em apontar a viabilidade técnico-ambiental e socioeconômica do projeto.

(10:56) Alex: A redução da oferta mais a energia a ser disponibilizada para o bombeamento estará em torno de 550 MW, segundo a própria Chesf. De maneira nenhuma, isso é uma página virada, como querem tratorar (de trator mesmo) os governistas. 550 MW, meu parlamentar, é uma carga que dá para alimentar quase toda a Paraíba. Pergunta se a Chesf, do ponto de vista técnico, e não político está confortável com essa responsabilidade. Se vai transpor 127 m3/s (valor máximo) naquele desnível, é preciso criar toda a infra-estrutura para isso - linhas, trafos, protetores, isolamento - mesmo que vá usar só quando Sobradinho verter. É como comprar um ônibus que vai transportar só 5 passageiros por dia, mas a cada 3 meses vai carregar 30 passageiros. Tem que prever a carga máxima. É assim que funciona a engenharia e a economia, meu doutor. Se quer ser eleito, não embarque nessa demagogia, pois os paraibanos vão sentir que foram traídos quando virem que além de não ter água para todos, quem tiver vai estar na miséria ainda. Procure outra plataforma eleitoral. Toda a discussão técnica do ponto de vista da sociedade, e não das empreiteiras e financiadores de campanha, você pode encontrar - e sabe disso - com a SBPC, Banco Mundial, ABES, CREAS e de quem realmente entende de engenharia.

(12:01) Dep_Gadelha: Alex, respeito sua opinião. No entanto, devo lembrá-lo que todos os dados aqui apresentados são decorrentes de estudos técnicos elaborados por empresas especializadas na área e revisados pelos técnicos de todo o poder público, inclusive os da Chesf. A possibilidade de transpor 127 metros cúbicos, como você mesmo mencionou, só se concretizará nos momentos em que a barragem de Sobradinho sangrar e quando isso ocorrer a vazão do rio chega a volumes impressionantes. Nestes casos, a quantidade de água retirada será irrisória, comparando-se com o volume que passará pelas hidrelétricas do rio. Ao contrário do que você disse, a preocupação com a geração de energia ocorrerá quando faltar água no rio e não quando ela for abundante. Lembre-se do apagão de alguns anos atrás, que foi decorrente de uma estiagem prolongada em todo o país. É a ausência de água que pode oferecer risco à geração de energia e não a sua abundância. Por fim, quero lembrá-lo que os estudos da própria Chesf indicam que apenas 1.300 metros cúbicos por segundo precisam ser vertidos pela barragem de Sobradinho para movimentar todo o seu complexo de hidrelétricas.

Benefícios

(09:39) Dagmar: Quantos estados seriam beneficiados pela transposição e quais bacias seriam integradas?

(09:59) Dep_Gadelha: Dagmar, seriam os estados de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Serão dois eixos: o primeiro captará águas em Cabrobó (PE) e as levará ao Ceará, ao oeste da Paraíba e ao Rio Grande do Norte (o chamado eixo norte). O segundo ponto de captação fica próximo à barragem de Itaparica e levará água ao leste de Pernambuco e da Paraíba. Em todas as regiões citadas, haverá a perenização de bacias atualmente intermitentes.

(09:40) Simone: De que forma a transposição vai beneficiar o pequeno proprietário? Ou só vai facilitar a vida dos grandes proprietários?

(10:00) Dep_Gadelha: Simone, o conceito básico do projeto é o da segurança hídrica. Isso significa que o pequeno proprietário, sempre em dúvida sobre plantar ou não em decorrência da expectativa de chuva no ano, não precisará mais se preocupar com essa variável. Chova ou faça sol, o agricultor terá a certeza da disponibilidade de água para o seu cultivo. Obviamente, grandes proprietários terão os mesmos benefícios, mas isso é igualmente salutar, pois há uma expectativa de que esses empreendedores possam gerar 150 mil empregos a partir de projetos de irrigação, que seriam inviáveis sem as águas do São Francisco. Além disso, 300 mil hectares de terra em torno da obra serão desapropriados pelo governo federal e, ato contínuo, destinados à reforma agrária, proporcionando a inclusão social de importante parcela da população do Nordeste Setentrional.

(10:05) nicolas: O projeto de transposição prega a irrigação de áreas para cultivo. Pergunto: as áreas próximas aos rios pertencem aos grandes latifundiários. Como que o pobre agricultor do alto sertão, como a região de Carolé do Rocha, vai se beneficiar dessa transposição?

(10:28) Dep Gadelha: Nicolas, as novas áreas previstas para irrigação serão aquelas situadas à margem dos canais, que serão desapropriadas para fins de reforma agrária. Serão 2,5 quilômetros de cada lado dos canais, o que vai totalizar cerca de 310 mil hectares, dos quais 50 mil adequados para irrigação, principalmente fruticultura irrigada. O restante das águas vai desembocar nas grandes barragens do Nordeste Setentrional (Coremas-Mãe d'Água, Castanhão-Epitácio Pessoa, Armando Ribeiro Gonçalves, etc), que são obras públicas, não pertencem a nenhum latifundiário, e funcionarão como caixas d'água para distribuição democrática ao resto da população. Alguns projetos de irrigação já existentes serão também beneficiados (Várzeas de Sousa, Apodi, Sumé, Campos Sales, etc). Esses projetos se beneficiarão da chamada sinergia hídrica, ou seja, utilizaremos em primeiro lugar as águas estocadas localmente nas diversas barragens. Só em caso de uma grande depleção hídrica nas mesmas, é que se abre a torneira do São Francisco para enchê-las outra vez.

(10:23) Gustavo: Em quanto tempo será compensado o custo do projeto?

(11:23) Dep_Gadelha: Gustavo, se considerarmos que os custos de duas secas são equivalentes ao investimento total do projeto, teríamos o retorno para a sociedade em apenas duas ocorrências deste fenômeno. Quero aproveitar para chamar a atenção para benefícios que transcendem a esfera financeira. A geração de empregos esperada tende a ser elemento de fixação do nordestino em sua terra natal, diminuindo o processo migratório que tanto marca o sertanejo. Para se ter uma idéia, calcula-se que um terço dos paraibanos vivam hoje fora de seu estado, por absoluta falta de perspectiva. Outro aspecto extremamente importante é o da diminuição na incidência de doenças infecto-contagiosas decorrentes do consumo de água imprópria para os seres humanos. Como esses, existem inúmeros outros benefícios de caráter social e de difícil mensuração que melhorarão sobremaneira a qualidade de vida do povo nordestino.

(10:32) Fernanda: E a população ribeirinha, terá suporte?

(11:29) Dep_Gadelha: Fernanda, além dos já citados controle de erosão e fomento à atividade pesqueira, o plano de bacias prevê a disponibilização de cerca de R$ 200 milhões ao longo dos próximos dez anos para ações de recuperação ambiental, reflorestamento ciliar e saneamento básico nos municípios ribeirinhos. Além disso, o Ministério das Cidades anunciou investimentos de R$ 620 milhões em projetos de saneamento básico e abastecimento de água em 86 cidades da bacia do rio São Francisco como complementação às ações de sua revitalização.

(10:37) tati: Alguns críticos do projeto dizem que a água da transposição não vai chegar à população difusa, que realmente sofre com a seca. Essa informação procede? Outro ponto levantado é com relação ao custo do projeto. Dizem que o valor de R$ 4,5 bilhões diz respeito apenas a construção dos canais, sem contar com o custo de manutenção.

(11:38) Dep Gadelha: Tati, já falamos sobre os custos do projeto e seu desdobramento no tempo. Em relação à população atendida, ela vai a 12 milhões de pessoas, distribuídas em 240 municípios entre população urbana e população difusa. As águas serão levadas por dois eixos. Não se poderia cobrir de forma capilar cada quilômetro quadrado do semi-árido, nem acrescentar mais eixos para o aporte de água. Mas os estados, de um modo geral, estão preparados para esta capilarização. Todos eles já construíram redes de adutoras muito amplas na expectativa de difusão das águas da transposição. Nada impede que esta capilarização prossiga e novas adutoras venham a ser construídas a partir dos eixos propostos ou de derivações já existentes.

(10:38) Simone: Os moradores da região poderão trabalhar na obra?

(11:41) Dep Gadelha: Simone, sim. A execução da obra prevê a utilização de mão-de-obra local. O número ainda não está devidamente quantificado. Mas acredita-se que em torno de 15 mil pessoas terão ocupação assegurada já na fase de construção dos canais. A expectativa é de que, depois de pronta, ela venha propiciar emprego direto para 200 mil pessoas e mais 600 mil empregos indiretos.

(10:39) Ângela: Senhor deputado, o programa de emergência do governo federal tem uma área de atuação delimitada pelo polígono das secas incluindo todos os estados do Nordeste, o norte de Minas Gerais e do Espírito Santo. A transposição do São Francisco teria uma área de influência bastante restrita deste território. Segundo Azis Absaber, a área de influência é de 5 % do semi-árido. Como justificar esta obra com o custo de emergência?

(11:46) Dep_Gadelha: Ângela, os estudos apontam para o beneficiamento de 12 milhões de pessoas nas áreas que receberão as águas do São Francisco. Creio que estes números, por si só, justificariam a consecução do projeto. Mas fazendo uma análise mais profunda, verificaremos que a melhoria da qualidade de vida de uma região, como a do Nordeste Setentrional, tende a, no médio prazo, melhorar também a qualidade de vida em outras regiões, uma vez que espera-se que haja a fixação do nordestino setentrional em sua terra natal, possibilitando a diminuição da migração e a conseqüente descompressão de determinados centros urbanos. Obviamente, o poder público e a sociedade civil organizada poderão disponibilizar uma parte maior das suas atenções e recursos para outras áreas deprimidas do país.

(10:40) ERICA: Deputado, em quanto tempo o governo estima retorno financeiro e social para esta obra?

(11:47) Dep Gadelha: Érica, o retorno financeiro é ilimitado no tempo. A obra visa a garantir sustentabilidade ao processo de desenvolvimento de quatro estados, incidindo em todos os campos da produção: agricultura, indústria, setor de serviços, turismo e lazer. Existe um retorno social que não pode ser quantificado em moeda e isso diz respeito à fixação do homem no semi-árido, à preservação da coesão familiar e ao retorno de "expatriados" - pessoas que migraram para o centro-sul e ocupam muitas vezes as estatísticas de marginalidade nessa região. Admitindo-se que se rompa o gargalo estrutural representado pela escassez hídrica, teremos retornos em conseqüência desse projeto durante pelo menos 50 anos. Do ponto de vista estritamente financeiro, o projeto se paga em duas secas, ou seja, aproximadamente oito anos.

Histórico

(09:59) Lorenzo-OEco: Bom dia, deputado. Gostaria primeiro de entender qual é o papel da comissão, uma vez que o projeto já recebeu licença prévia e vai começar a licitação para as obras.

(10:11) Dep Gadelha: Lorenzo-Oeco, o papel da comissão é fazer o acompanhamento legislativo, jurídico e técnico do projeto e, assim, acompanhar a sua execução orçamentária, podendo intervir quando e se houver necessidade. No cumprimento dos seus objetivos, a comissão já realizou audiências públicas com governadores dos estados ribeirinhos (Paulo Souto e João Alves) e tem outras audiências agendadas com diversas autoridades. Estamos organizando uma visita da comissão para a região da foz do rio São Francisco para uma inspeção <i>in loco</i> das condições de oferta hídrica e da qualidade da água. A comissão recebe também sugestões e propostas, como a do deputado Luiz Carreira, da Bahia, em favor de um plebiscito sobre a matéria, e acolhe opiniões da sociedade em geral. Dos trabalhos, deverão resultar um projeto de indicação, que é uma formulação regimental em que a Câmara manifesta aprovação ou rejeição de determinada iniciativa do Poder Executivo, podendo propor modificações.

(10:03) Regina: Algumas pessoas da comunidade de Piaçabuçu (AL) argumentam que já existem canais prontos para irrigar o semi-árido de Alagoas há muitos anos, mas nunca fizeram a ligação com o São Francisco... Esses canais serão integrados nesta transposição?

(10:16) Dep_Gadelha: Regina, existem vários projetos complementares à transposição, cuja incumbência caberá aos estados. No caso do estado de Alagoas, a comunidade deve se organizar para elaborar a sua pauta de prioridades, tal qual fizemos nos estados do Nordeste Setentrional. A sua pergunta é extremamente importante porque ressalta o caráter plural deste projeto. Como prevê a Constituição Federal, todo rio que cruza mais de um estado é patrimônio da União e, portanto, o usufruto de suas águas cabe a todos os brasileiros. A implementação do projeto de transposição é o primeiro de uma série de projetos dessa natureza, que deverão ser concretizados em todo o país nos próximos anos. O Brasil é a nação com maior manancial de água doce do mundo. No entanto, a maior parte dessas águas está concentrada em partes específicas do País. Nesse sentido, o projeto de transposição do São Francisco é o pontapé inicial de uma série de ações correlatas que podem e devem ser implementadas para garantir o desenvolvimento de várias regiões do país. Gostaria de informar, por fim, que o ministro Ciro Gomes já se colocou à disposição para receber sugestões de novas derivações do projeto. Assim, gostaria de sugerir que a comunidade de Piaçabuçu prepare manifesto solicitando a consecução do referido canal.

(10:08) Marina: Como o senhor teve a visão de resgatar um projeto de mais de 150 anos e que parecia morto e como se sente neste momento em que o sonho de milhões de nordestinos começa a se concretizar?

(10:28) Dep_Gadelha: Marina, como você bem ressaltou, o sonho de transpor o rio São Francisco para o Nordeste Setentrional alimenta o imaginário do nordestino há mais de um século. As versões mais modernas do projeto, por sua vez, datam de 1984, quando o então ministro Mario Andreazza determinou a elaboração de uma proposta que previa a retirada de 400 metros cúbicos por segundo. Com a saída do ministro, o assunto foi engavetado e eu tive a felicidade de resgatá-lo, ao promover em 1991, na minha cidade natal de Sousa (PB), encontro no qual o engenheiro responsável pelo projeto, José de Ribamar Simas, do Banco Mundial, reapresentou o seu plano. Desde então, juntamente com outros nordestinos, tenho empreendido uma cruzada em prol da consecução deste projeto. Concomitantemente, o Executivo federal realizou uma sintonia fina no modelo de transposição a ser concretizado e hoje, graças à sensibilidade do ministro Ciro Gomes, o projeto parece pronto para sair da prancheta. Com a previsão da retirada de somente 26 metros cúbicos por segundo, o que representa apenas 1% da água que o rio São Francisco joga no mar. Assim, compartilho da alegria de todos os nordestinos setentrionais com a realização do sonho, ao passo em que me sinto recompensado por essa luta pessoal de mais de duas décadas.

(10:12) Alexandro Pereira: Sou a favor da transposição, será uma esperança para o Nordeste. Agora, acho que não será uma solução concreta! Deputado, no norte da Bahia, há 30 anos, foi realizada a construção do lago de Sobradrinho, onde foi necessário deslocar as cidades de Casa Nova, Remanso, Pilão Arcado, Sento Sé e Sobradinho. Água para essas localidades não falta. Agora, o sistema de abastecimento encontra-se em grande déficit. Resumindo, de onde tirar água o Nordeste tem. Agora, um pós-projeto de manutenção nos sistemas é o que está faltando, a transposição tem algo em vista como um pós-projeto de manutenção?

(10:48) Dep Gadelha Fala com TODOS: Alexandro Pereira, a resposta é sim. A transposição é apenas uma parte de um grande projeto de integração de bacias e revitalização que se desdobrará em inúmeras seqüências ao longo de pelo menos 20 anos. Aí se incluem a construção de barragens sobre os afluentes do São Francisco para aumentar a vazão no curso médio do rio, as ações de despoluição, desassoreamento e revegetação das matas ciliares, a melhoria da navegabilidade do rio São Francisco e a futura interligação com a bacia do rio Tocantins. No que diz respeito ao abastecimento das populações ribeirinhas, o governo já está disponibilizando R$ 600 milhões, através do Ministério das Cidades. A população deve fazer um acompanhamento dessas ações, mas é bom não esquecer que muitas vezes o problema decorre da própria desídia de autoridades locais, sejam elas municipais ou estaduais. Para abastecer uma cidade às margens do rio, não há necessidade sequer de outorga e qualquer município pode tomar iniciativas concretas. A alegação de falta de recursos não procede. Para você ter uma idéia, a Chesf já disponibiliza 6% do seu faturamento para compensação dos estados e municípios ribeirinhos pelo uso das águas para fins de geração de energia elétrica. Faça as contas e você vai ver que, de 1988 para cá, quase R$ 1,5 bilhão já foram alocados, a fundo perdido, sem maiores resultados práticos.

(10:12) Willy: Qual a razão do Banco Mundial e demais organismos internacionais recusarem financiar a obra, condenando o projeto? Isto não é indicativo de que algo de podre há nesse <i>imbroglio</i>?

(10:14) Regina: Willy, você acha mesmo que o Banco Mundial é idôneo e quer somente coisas boas para o Brasil??? Eles são um BANCO!!!!!

(10:18) Willy: Banco não entra para perder, eu sei, mas sempre investiram quando viram potencialidades nos projetos!

(10:21) Regina: Certo, Willy, mas potencialidades financeiras, infelizmente... não interessa se o projeto vai beneficiar ou não a população, degradar ou não o meio ambiente, eles querem saber dos LUCROS!!!!!

(10:41) andriguetto: Caro Dep. Gadelha, independente da titularidade, água no Brasil, por imposição constitucional, é um bem público, quer superficial ou subterrânea. Portanto, não é somente quando a titularidade é da União que a água é usufruto de todos os brasileiros. Nossa legislação sobre gestão de recursos hídricos encontra-se entre as mais modernas do mundo, o único senão é que tem se arrastada na sua efetiva aplicação. Transposição e outros conflitos poderão ser geridos pela Lei 9.433, desde que realmente observada na íntegra, bem como legislações estaduais específicas. Prezados Willy e Regina, o Banco Mundial tem participação, inclusive a fundo perdido, em vários projetos de gestão de recursos hídricos em todo o mundo, pois sua característica principal não é apenas lucro, e sim desenvolvimento humano e alívio da pobreza, pois naturalmente assim se melhora também o aspecto econômico dos países que formam sua estrutura de capital. Aliás, sugiro uma visita aos estatutos do Banco Mundial e verificação das percentagens de formação de capital social, bem como a origem desses capitais... Pode ser que muitos de vocês se surpreendam...

(10:44) Willy: É verdade, andriguetto, o apoio que o Banco Mundial vem dando ao Brasil é inestimável. Mas, quanto ao projeto de transposição, eles simplesmente consideraram inviável!

(11:06) Dep Gadelha: Willy, Regina e Andriguetto, eu tenho duas opiniões sobre a posição do Banco Mundial nessa matéria. A primeira, mais pessimista, é de que se trate de pura hipocrisia do Banco Mundial. Há uma coisa que pouca gente sabe nesse país: é que o Banco Mundial foi o primeiro financiador dos estudos de transposição no Brasil. Ainda ao tempo do ministro Mario Andreazza, no regime militar, portanto, o Banco Mundial financiou integralmente a primeira proposta de transposição de águas do rio São Francisco, que era muito mais radical do que a de hoje e previa a derivação de 300 metros cúbicos por segundo, contra apenas os 63 atuais. Naquele tempo, os estudos foram coordenados pelo DNOS (Departamento Nacional de Obras Sociais) e tinham como orientador o engenheiro José de Ribamar Simas, que contratou uma empresa brasileira (a Hidroservice) e uma empresa americana, que atuaram em consórcio, tudo bancado pelo BIRD (Banco Mundial). Com a derrota da candidatura de Andreazza à presidência da República na convenção do PDS, o projeto voltou para os escaninhos do Banco Mundial, em Washington, e o próprio Simas foi trabalhar lá. Foi junto ao Banco Mundial que nós resgatamos o projeto, que foi depois encaminhado ao presidente Itamar Franco e com os desdobramentos que todos conhecem. É surpreendente, portanto, o comportamento do Banco Mundial em relação a esse projeto que direta ou indiretamente é fruto do seu próprio ventre. A outra opinião, mais otimista, é de que o veto do Banco Mundial se refira ao projeto anterior, de Fernando Henrique Cardoso, que não contemplava o processo de revitalização do rio São Francisco, que está incluído agora com riqueza de detalhes no projeto Luiz Inácio Lula da Silva. Como o Banco Mundial não especifica as suas razões, valem as duas hipóteses.

(11:15) andriguetto: Prezado deputado, percebo que o Banco Mundial trabalha sobre uma lógica estratégica, verificando se os projetos encontram-se alinhados com uma política, com um plano e com programas, quase sempre dentro de uma visão conceitual. Temos uma legislação de recursos hídricos e ambiental apoiada pelo Banco Mundial. Caso o banco perceba o não entendimento da lógica conceitual e estratégica, não é que ele vete o projeto, apenas ele passa a considerar outros que sigam tal lógica, mudando prioridades.

(10:26) *Dagmar: Qual a maior dificuldade técnica para transpor o rio?

(11:22) Dep Gadelha: Dagmar, na verdade, não há dificuldade técnica para transpor o rio. A engenharia brasileira tem soluções para todo tipo de problema envolvido numa obra dessa natureza, inclusive experiência prática de realização de obras difíceis em outros países, como a transposição do rio Chavimochic, no Peru, realizada por uma firma brasileira. A questão a resolver é encontrar o trajeto mais barato e mais eficaz para o transporte das águas. O atual projeto resultou da análise de 22 alternativas e supõe-se que seja o estado da arte. Também, do ponto de vista financeiro e ambiental, todas as questões foram bem resolvidas. O que subsiste é o impasse político e esta, sim, é a maior dificuldade que o projeto sempre enfrentou.

(10:43) Ângela: O governo da Paraíba construiu a barragem de Acauã, com capacidade de armazenamento de 270 milhões de metros cúbicos para resolver definitivamente o problemas de abastecimento da cidade de Campina Grande. Por que o governo, antes da transposição, não constrói uma adutora para transportar a água da barragem para a cidade de Campina Grande?

(11:52) Dep Gadelha: Ângela, as adutoras a nível local serão responsabilidade dos governos estaduais. O projeto não contempla a construção de adutoras, a não ser em algumas situações excepcionais, como é o caso de uma derivação para atender ao Vale do Piancó, na Paraíba, o Vale do Pajeú e a região de Santa Cruz do Capibaribe, no estado de Pernambuco.

(10:56) andriguetto: Prezado Dep. Gadelha, ao contrário da "água", o serviço público de abastecimento e esgotamento sanitário, por princípio constitucional é de responsabilidade dos municípios, que poderão prestá-lo diretamente ou através de concessão. Em quaisquer dos casos, será necessária outorga do titular do bem público, seja a União ou o Estado.

(11:58) Dep Gadelha: Andriguetto, concordo com você que o serviço de abastecimento e esgotamento é responsabilidade dos municípios, que poderão prestá-lo diretamente ou através de concessão. Esta é uma interpretação que nós - eu, você e outras pessoas - temos do texto constitucional. Mas há uma controvérsia brava sobre esta matéria e muitas empresas estaduais se recusam a devolver serviços já concedidos quando reclamados pelos municípios. O Governo Lula tem um anteprojeto regulamentando esta matéria e esclarecendo definitivamente que abastecimento é um "serviço de interesse local", a que se refere a Constituição. Infelizmente, o anteprojeto foi anunciado em outubro do ano passado, mas até agora não chegou ao Congresso.

(11:14) Alex: Além de copiar a política econômica e de outros projetos tucanos, o atual projeto de transposição é copia autenticada e com firma reconhecida do antigo projeto de FHC. Vamos ter pelo menos imaginação! Imagine Ciro Gomes - muita verborragia mas de pouca credibilidade - ser candidato ao governo do Rio - de onde nunca sai . Vai querer transpor a Baía da Guanabara para a Baixada Fluminense para aumentar o turismo naquela região e salvar milhares de fluminenses da falta de turistas.

(12:12) Dep Gadelha: Alex, há uma diferença brutal entre o projeto de Lula e o de FHC. O projeto de Lula apresenta um capítulo específico e muito detalhado sobre a revitalização, com definição clara de recursos e linhas de atuação. O projeto de FHC não dedicava uma linha sequer à revitalização. E esse é o diferencial reclamado pelas populações ribeirinhas e pelos estados interessados. Quanto à transposição da Baía de Guanabara, deve ser uma aspiração sua, como bom turista, mas vamos ficar lhe devendo essa.